Sempre que passo uns dias no Alentejo tenho um turbilhão de emoções contraditórias. Se por uns momentos fico sem ar (literalmente) ao observar a paisagem imóvel do inicio da tarde, por outros olho a velha estrada de terra batida e penso simplesmente no plano de antigamente, pôr-me a milhas. Tenho com o Alentejo uma espécie de relação, que como qualquer outra relação têm algures na embalagem umas letras pequeninas que avisam: ”Consumir de preferência antes de...”, letrinhas essas que eu, nesta como em qualquer outra relação, teimo em não ler, ou ignorar, quando por um qualquer motivo, pego o bicho como (não) deve ser e encaro a coisa como ela na realidade é, sem óculos cor-de-rosa, sem lacinhos na ponta das tranças e sem cavalinhos de pau (já vos falei do meu cavalinho de pau? Não? Provavelmente não falei porque ainda estou ressentida por o terem dado, mas isso fica para outro dia). Estava eu a falar-vos deste meu amor enorme por esta terra. Deste meu sentimento desmedido, deste meu encantamento. Falava-vos eu desta minha loucura em forma de trigo loiro, erguido, quieto, sob o sol escaldante do meio dia. Falava-vos eu desta minha eterna e incontornavel paixão, desde que vivida na confortável distância de uma hora. Falava-vos eu desta desaconselhável forma de sugar esta terra, para além da validade aconselhável, coisa que pelo facto de ser um produto fresco, conservado acima dos 40ºC, não deve ir além do terceiro dia. Falava-vos eu que finda essa validade, tudo fica apenas seco, com um pequeno travo a ranço. Falava-vos eu deste meu lindo amor, que para o ser, como a maioria dos grandes amores, tem que ser platónico, vivido entre ais de saudades e pequenas caricias fugidias. Tem que ter apenas uma ou outra noite tórrida espaçada no tempo, tem que ser fantasiado e não vivido, sob pena de perder o encanto.
Falava-vos eu de Alentejo, porque dele não posso fugir, mas o que queria mesmo era pedir-vos que verificassem a embalagem que têm ai por casa, se já tiver expirado preparem-se para a jogar no lixo, porque se insistirem em consumir dela, pode até ser que se deliciem por momentos, mas mais cedo que tarde chega a esperada dor de barriga e intoxicação alimentar!
Falava-vos eu de Alentejo, porque dele não posso fugir, mas o que queria mesmo era pedir-vos que verificassem a embalagem que têm ai por casa, se já tiver expirado preparem-se para a jogar no lixo, porque se insistirem em consumir dela, pode até ser que se deliciem por momentos, mas mais cedo que tarde chega a esperada dor de barriga e intoxicação alimentar!